sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Mitos litúrgicos - Parte III

Mito 15. “O Ministério extraordinário da Sagrada Comunhão existe para promover a participação dos leigos.”

Não existe para isso, pois ordinariamente a função do leigo não é distribuir o Corpo de Deus.

Isso afirma expressamente a Instrução Redemptionis Sacramentum (n. 151): “Somente em caso de verdadeira necessidade se deverá recorrer à ajuda dos ministros extroardinários na celebração da liturgia. De fato, isto não está previsto para assegurar a participação mais plena dos leigos, mas é por sua natureza supletivo e provisório.”

O ministro ordinário da Comunhão Eucarística, pela unção do Sacramento da Ordem, é o sacerdote e o diácono (Cânon 910). Por isso, ordinariamente somente eles podem ministrar a Corpo de Nosso Senhor.

Havendo real necessidade, o ministro extraordinário pode distribuir a Comunhão Eucarística. Os ministros extraordinários são prioritariamente os acólitos instituídos (cânon 910). Não havendo acólitos instituídos disponíveis para isso, outros fiéis (religiosos ou leigos) podem atuar ministrando a Comunhão Eucarística, como aponta a Instrução Redemptionis Sacramentum (n. 155) Tais situações são, de fato, extraordinárias, como o próprio nome do ministério já o indica.

Portanto, é um equívoco afirmar que o Ministério Extraordinário da Comunhão Eucarística existe para promover o serviço do leigo, pois esta função não é, ordinariamente, uma atribuição do leigo, e em uma situação em que houvesse um número maior de ministros ordinários o ministério extraordinário não haveria razões para existir.

Quais seriam estas razões que indicariam esta “verdadeira necessidade” para o uso dos ministros extraordinários da Comunhão Eucarística? A própria Instrução responde: “O ministro extraordinário da sagrada Comunhão poderá administrar a Comunhão somente na ausência do sacerdote ou diácono, quando o sacerdote está impedido por enfermidade, idade avançada, ou por outra verdadeira causa, ou quando é tão grande o número dos fiéis que se reúnem à Comunhão, que a celebração da Missa se prolongaria demasiado. Por isso, deve-se entender que uma breve prolongação seria uma causa absolutamente suportável, de acordo com a cultura e os costumes próprios do lugar.” (n. 158) E ainda: “Reprove-se o costume daqueles sacerdotes que, apesar de estarem presentes na celebração, abstém-se de distribuir a Comunhão, delegando esta tarefa a leigos.” (n. 157)





Mito 16. “O cálice e o cibório podem ser de qualquer material”

Não podem.

A Santa Igreja zela pelo material do cálice, cibórios e outros vasos sagrados utilizados nas celebrações. Por exemplo: é expressamente proibido o uso de vasos sagrados de vidro, barro, argila, cristal ou outro material que quebre com facilidade.

Especifica a Instrução Redemptionis Sacramentum (n. 117): “Os vasos sagrados, que estão destinados a receber o Corpo e o Sangue do Senhor, devem-se ser fabricados, estritamente, conforme as normas da tradição e dos livros litúrgicos. As Conferências de Bispos tenham capacidade de decidir, com a aprovação da Sé apostólica, se é oportuno que os vasos sagrados também sejam elaborados com outros materiais sólidos. Sem dúvida, requer-se estritamente que este material, de acordo com a comum valorização de cada região, seja verdadeiramente nobre, de maneira que, com seu uso, tribute-se honra ao Senhor e se evite absolutamente o perigo de enfraquecer, aos olhos dos fiéis, a doutrina da presença real de Cristo nas espécies eucarísticas. Portanto, reprove-se qualquer uso, para a celebração da Missa, de vasos comuns ou de escasso valor, no que se refere à qualidade, ou carentes de todo valor artístico, ou simples recipientes, ou outros vasos de cristal, argila, porcelana e outros materiais que se quebram facilmente. Isto vale também para os metais e outros materiais, que se corroem (oxidam) facilmente.”

O saudoso Papa João Paulo II insiste na utilização dos melhores recursos possíveis nos objetos litúrgicos, como honra prestada ao Corpo e ao Sacrifício de Nosso Senhor. Disse João Paulo II (Ecclesia de Eucharistia, n. 47-48):

“Quando alguém lê o relato da instituição da Eucaristia nos Evangelhos Sinópticos, fica admirado ao ver a simplicidade e simultaneamente a dignidade com que Jesus, na noite da Última Ceia, institui este grande sacramento. Há um episódio que, de certo modo, lhe serve de prelúdio: é a unção de Betânia. Uma mulher, que João identifica como sendo Maria, irmã de Lázaro, derrama sobre a cabeça de Jesus um vaso de perfume precioso, suscitando nos discípulos – particularmente em Judas (Mt 26, 8; Mc 14, 4; Jo 12, 4) – uma reacção de protesto contra tal gesto que, em face das necessidades dos pobres, constituía um « desperdício » intolerável. Mas Jesus faz uma avaliação muito diferente: sem nada tirar ao dever da caridade para com os necessitados, aos quais sempre se hão-de dedicar os discípulos – « Pobres, sempre os tereis convosco » (Jo 12, 8; cf. Mt 26, 11; Mc 14, 7) -, Ele pensa no momento já próximo da sua morte e sepultura, considerando a unção que Lhe foi feita como uma antecipação daquelas honras de que continuará a ser digno o seu corpo mesmo depois da morte, porque indissoluvelmente ligado ao mistério da sua pessoa. (…) Tal como a mulher da unção de Betânia, a Igreja não temeu « desperdiçar », investindo o melhor dos seus recursos para exprimir o seu enlevo e adoração diante do dom incomensurável da Eucaristia. À semelhança dos primeiros discípulos encarregados de preparar a « grande sala », ela sentiu-se impelida, ao longo dos séculos e no alternar-se das culturas, a celebrar a Eucaristia num ambiente digno de tão grande mistério. Foi sob o impulso das palavras e gestos de Jesus, desenvolvendo a herança ritual do judaísmo, que nasceu a liturgia cristã. Porventura haverá algo que seja capaz de exprimir de forma devida o acolhimento do dom que o Esposo divino continuamente faz de Si mesmo à Igreja-Esposa, colocando ao alcance das sucessivas gerações de crentes o sacrifício que ofereceu uma vez por todas na cruz e tornando-Se alimento para todos os fiéis? Se a ideia do « banquete » inspira familiaridade, a Igreja nunca cedeu à tentação de banalizar esta « intimidade » com o seu Esposo, recordando-se que Ele é também o seu Senhor e que, embora « banquete », permanece sempre um banquete sacrificial, assinalado com o sangue derramado no Gólgota. O Banquete eucarístico é verdadeiramente banquete « sagrado », onde, na simplicidade dos sinais, se esconde o abismo da santidade de Deus: O Sacrum convivium, in quo Christus sumitur! – « Ó Sagrado Banquete, em que se recebe Cristo! »”

Mito 17: “Os fiéis podem rezar junto a doxologia e a oração da paz”

Não podem.

Diz o Código de Direito Canônico (Cânon 907) que “Na celebração Eucarística, não é lícito aos diáconos e leigos proferir as orações, especialmente a oração eucarística, ou executar as ações próprios do sacerdote celebrante.”

Também a Instrução Inaestimabile Donum (n.4) afirma: “Está reservado ao sacerdote, em virtude de sua ordenação, proclamar a Oração Eucarística, a qual por sua própria natureza é o ponto alto de toda a celebração. É portanto um abuso que algumas partes da Oração Eucarística sejam ditas pelo diácono, por um ministro subordinado ou pelos fiéis. Por outro lado isso não significa que a assembléia permanece passiva e inerte. Ela se une ao sacerdote através do silêncio e demonstra a sua participação nos vários momentos de intervenção providenciados para o curso da Oração Eucarística: as respostas no diálogo Prefácio, o Sanctus, a aclamação depois da Consagração, e o Amén final depois do Per Ipsum. O Per Ipsum ( por Cristo, com Cristo, em Cristo) por si mesmo é reservado somente ao sacerdote. Este Amén final deveria ser enfatizado sendo feito cantado, sendo que ele é o mais importante de toda a Missa.”

Tais orações são orações do sacerdote. De forma especial, a doxologia (“Por Cristo, com Cristo e em Cristo…”), que é momento onde o sacerdote oferece à Deus Pai o Santo Sacrifício de Nosso Senhor.

Mito 18: “O sacerdote usar casula é algo ultrapassado”

Não é.

A casula é o paramento sacerdotal próprio para o Santo Sacrifício da Missa. É o mais solene, varia de cor conforme a prescrição para a celebração em específico e vai sobre a alva e estola. Infelizmente, tem se tornado moda em muitos lugares que muitos sacerdotes celebrem usando apenas a alva e a estola, enquanto as casulas mofam nos armários.

A Instrução Geral do Missal Romano (n. 119) determina que o sacerdote utilize: amito, alva, estola, cíngulo e casula (amito e cíngulo podem ser dispensáveis, conforme o formato da alva).

A Instrução Redemptinis Sacramentum determina ainda que, sendo possível, inclusive os sacerdotes concelebrantes utilizem a casula (n. 124-126):

“No Missal Romano é facultativo que os sacerdotes que concelebram na Missa, exceto o celebrante principal (que sempre deve levar a casula da cor prescrita), possam omitir «a casula ou planeta, mas sempre usar a estola sobre a alva», quando haja uma justa causa, por exemplo o grande número de concelebrantes e a falta de ornamentos. Sem dúvida, no caso de que esta necessidade se possa prever, na medida do possível, providencie-se as referidas vestes. Os concelebrantes, a exceção do celebrante principal, podem também levar a casula de cor branca, em caso de necessidade. (…) Seja reprovado o abuso de que os sagrados ministros realizem a santa Missa, inclusive com a participação de só um assistente, sem usar as vestes sagradas ou só com a estola sobre a roupa monástica, ou o hábito comum dos religiosos, ou a roupa comum, contra o prescrito nos livros litúrgicos. Os Ordinários cuidem de que este tipo de abusos sejam corrigidos rapidamente e haja, em todas as igrejas e oratórios de sua jurisdição, um número adequado de vestes litúrgicos, confeccionadas de acordo com as normas.”

Embora haja para o Brasil a concessão de o sacerdote celebrar apenas utilizando alva e estola quando houver razões pastorais (ver comentário do Pe. Jesús Hortal, SJ, à respeito do cânon 929, no Código de Direito Canônico editado pela Loyola), de forma alguma pode-se dizer que o uso da casula é ultrapassado, como foi demonstrado acima.

Mito 19: “O Concílio Vaticano II aboliu o latim”

Não aboliu.

Pelo contrário: o Concílio Vaticano II incentivou o uso do latim como língua litúrgica.

Diz o Concílio (Sacrossanctum Concilium, n.36) : “Salvo o direito particular, seja conservado o uso da língua latina nos ritos latinos.” Embora exista atualmente em muitos lugares a concessão para se celebrar em língua local, o latim segue sendo a língua oficial da Santa Igreja e mantém o seu significado de unidade e solenidade: “O uso da língua latina vigente em grande parte da Igreja é um caro sinal da unidade e um eficaz remédio contra toda corruptela da pura doutrina.” (Papa Pio XII, na Encíclica Mediator Dei, n.53, de 1947)

Por isso o Santo Padre Bento escreveu (Sacramentum Caritatis, n.62): “A nível geral, peço que os futuros sacerdotes sejam preparados, desde o tempo do seminário, para compreender e celebrar a Santa Missa em latim, bem como para usar textos latinos e entoar o canto gregoriano; nem se transcure a possibilidade de formar os próprios fiéis para saberem, em latim, as orações mais comuns e cantarem, em gregoriano, determinadas partes da liturgia.”

E a Instrução Redemptionis Sacramentum (n. 112) determina: “Excetuadas as Celebrações da Missa que, de acordo com as horas e os momentos, a autoridade eclesiástica estabelece que se façam na língua do povo, sempre e em qualquer lugar é lícito aos sacerdotes celebrar o santo Sacrifício em latim.”

O Cardeal Ratzinger, hoje Papa Bento XVI (no livro “O sal da Terra”, de 1996), reconhece que a “nossa cultura mudou tão radicalmente nos últimos trinta anos que uma liturgia celebrada exclusivamente em latim envolveria um elemento de estranheza que, para muitos, não seria aceitável.” Por outro lado, “o Cardeal (Francis Arinze, Prefeito da Congregação para o Culto Divino e Disciplina dos Sacramento) também sugeriu que as paróquias maiores tenham uma Missa em latim pelo menos uma vez por semana e que as paróquias rurais e menores a tivessem pelo menos uma vez ao mês.” (ACI Imprensa, 16 de Novembro de 2006)

Mito 20: “Para participar bem da Missa é preciso entender a língua que o padre celebra”

Não é.

Embora possa ser útil compreender a língua que o padre celebra (e por isso são amplamente divulgados os missais com tradução em latim / português, nos meios em que a Santa Missa é celebrada em latim), o principal é contemplar o Mistério do Santo Sacrifício que se renova no altar, e para isso não é necessário compreender todas as palavras.

Missa não é jogral.

O Cardeal Ratzinger, hoje Papa Bento XVI, afirma (“O sal da terra”): “A Liturgia é algo diferente da manipulação de textos e ritos, porque vive, precisamente, do que não é manipulável. A juventude sente isso intensamente. Os centros onde a Liturgia é celebrada sem fantasias e com reverência atraem, mesmo que não se compreendam todas as palavras.”

Mito 21: “O canto gregoriano é algo ultrapassado”

Não é.

O Concílio Vaticano II afirma (Sacrossanctum Concilium, n.116) : “”A Igreja reconhece como canto próprio da liturgia romana, o canto gregoriano; portanto, na ação litúrgica, ocupa o primeiro lugar entre seus similares. Os outros gêneros de música sacra, especialmente a polifonia, não são absolutamente excluídos da celebração dos ofícios divinos, desde que se harmonizem com o espírito da ação litúrgica…”

A Instrução Geral do Missal Romano (n. 41) afirma: “Em igualdade de circunstâncias, dê-se a primazia ao canto gregoriano, como canto próprio da Liturgia romana.”

Também o Santo Padre Bento XVI incentiva o canto gregoriano na Exortação Apostólica Sacramentum Caritatis (n.62), como foi dito acima.É importante lembrar: mesmo em relação a canto popular, a referência é canto gregoriano. O saudoso Papa João Paulo II (Quirógrafo sobre a Música Sacra, n. 12) diz:

“No que diz respeito às composições musicais litúrgicas, faço minha a «regra geral» que são Pio X formulava com estes termos: ‘Uma composição para a Igreja é tanto mais sacra e litúrgica quanto mais se aproximar, no andamento, na inspiração e no sabor, da melodia gregoriana, e tanto menos é digna do templo, quanto mais se reconhece disforme daquele modelo supremo». Não se trata, evidentemente, de copiar o canto gregoriano, mas muito mais de considerar que as novas composições sejam absorvidas pelo mesmo espírito que suscitou e, pouco a pouco, modelou aquele canto.”

Mito 22: “Atualmente o padre tem que rezar de frente para os fiéis”

Não tem.

Foi publicada em 1993, no seu boletim Notitiae, uma nota da Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos reafirma a licitude tanto da celebração “Versus Populum” (com o sacerdote voltado para o povo) quanto da “Versus Deum” (com o sacerdote e povo voltados para Deus, isto é, na mesma direção)

Assim, mesmo na forma do Rito Romano aprovada pelo Papa Paulo VI, é perfeitamente possível que se celebre a Santa Missa com o sacerdote e os fiéis voltados na mesma direção.

O Cardeal Ratzinger, hoje Papa Bento XVI dedicou à este tema um capítulo inteiro do seu livro “Espírito da Liturgia – Uma introdução”, publicado em 1999; é o capítulo III da parte II, denominado “O altar e a orientação da oração na Liturgia”.

Neste texto, o Santo Padre incentiva a celebração em “Versus Deum”, exaltando o profundo significado litúrgico que tem o sacerdote e os fiéis voltados para a mesma direção, isto é, para Deus. Ele diz: “. “O sacerdote olhando para o povo dá à comunidade o aspecto de um círculo fechado em si mesmo. Já não é – por sua mesma disposição – uma comunidade aberta para frente e para cima, senão fechada em si mesma. (… ) O importante não é o diálogo olhando para o sacerdote, mas a adoração comum, sair ao encontro do Senhor que vem. A essência do acontecimento não é um círculo fechado, mas a saída de todos ao encontro do Senhor que se expressa na orientação comum.”

Mito 23: “O Sacrário no centro é anti-litúrgico”

Não é.

O Santo Padre Bento XVI (Sacramentum Caritatis, n. 69) afirma que, se o Sacrário é colocado na nave principal da Igreja, “é preferível colocar o sacrário no presbitério, em lugar suficientemente elevado, no centro do fecho absidal ou então noutro ponto onde fique de igual modo bem visível.”

O Sacrário no centro tem, no espírito tradicional da Sagrada Liturgia, o significado de dar a Jesus Eucarístico o destaque no lugar central.

Mito 24: “Não se deve ter imagens dos santos nas igrejas”

Deve-se ter, sim.

Diz a Instrução Geral do Missal Romano (n.318): “De acordo com a antiqüíssima tradição da Igreja, expõem-se à veneração dos fiéis, nos edifícios sagrados, imagens do Senhor, da bem-aventurada Virgem Maria e dos Santos, as quais devem estar dispostas de tal modo no lugar sagrado, que os fiéis sejam levados aos mistérios da fé que aí se celebram.”

O que é ponderado, porém, na mesma referência: “Tenha-se, por isso, o cuidado de não aumentar exageradamente o seu número e que a sua disposição se faça na ordem devida, de tal modo que não distraiam os fiéis da celebração. Normalmente, não haja na mesma igreja mais do que uma imagem do mesmo Santo. Em geral, no ornamento e disposição da igreja, no que se refere às imagens, procure atender-se à piedade de toda a comunidade e à beleza e dignidade das imagens.”

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